O Ultimo Cervo Branco

Por Radamanto |

A névoa agarrava-se aos pinheiros da Floresta Negra como um sudário frio, silenciando quase tudo, exceto a respiração ofegante de Bjorn e o estalo ocasional de um galho sob suas botas de couro desgastadas. O arco de amieiro estava pesado em sua mão, a corda tensa, mas a flecha ainda não estava na posição. Paciência. Era a primeira lição e a última.

Bjorn não era um guerreiro no sentido épico. Sua batalha não era contra draugrs ou trolls, embora já tivesse enfrentado ambos com relutância e uma boa dose de sorte. Sua vocação era a caça. A carne para a aldeia, as peles para o calor, os ossos para ferramentas. Mas hoje, sua presa era diferente. Não era por necessidade, mas por lenda.

Há luas, os anciãos contavam sobre o Cervo Branco, um espírito da floresta tão antigo quanto as próprias árvores, cuja aparição era um presságio – de boa sorte para alguns, de mudança para outros. Ninguém jamais o havia caçado. Diziam que flechas o atravessavam como fumaça, que ele se movia entre as árvores sem deslocar uma única folha. Mas Bjorn, em suas longas vigílias na floresta, havia encontrado rastros. Pegadas estranhamente luminescentes na lama congelada, tufos de pelo de um branco impossível presos em arbustos espinhosos. A lenda era real. E algo dentro dele, uma curiosidade mais forte que o bom senso, o impelia a seguir.

Ele estava há três dias na trilha, o cheiro de ozônio e terra úmida preenchendo seus pulmões. O silêncio da floresta era pesado, expectante. Até os Grasnos (Greylings) pareciam ter se escondido. Foi então que ele viu.

Do outro lado de uma clareira coberta de musgo, estava ele. O Cervo Branco. Era maior do que qualquer cervo que Bjorn já vira, seus pelos irradiavam uma luz pálida e suave que parecia empurrar a própria névoa para longe. Seus olhos não eram de um animal, mas sim poços de estrelas líquidas, antigos e sábios. Sua galhada parecia feita de madeira prateada, brilhando com gotas de orvalho como diamantes.

O instinto de caçador gritou. O arco subiu, a flecha com ponta de sílex encontrou a corda. Seu coração martelava contra as costelas. Uma única flecha bem colocada poderia derrubá-lo? A carne alimentaria a aldeia por uma semana, a pele seria um tesouro.

Mas, enquanto mirava, os olhos estrelados do cervo encontraram os seus. Não havia medo neles, apenas um reconhecimento profundo, uma tristeza ancestral. Bjorn viu imagens em sua mente, não como pensamentos, mas como sentimentos: florestas intocadas antes da chegada dos vikings, o ciclo interminável de vida e morte, a dor da terra sob o machado e o fogo. Viu a si mesmo, um pequeno elo em uma corrente imensa, um filho daquele mesmo mundo que ele ajudava a consumir.

Sua mão tremeu. A tensão do arco diminuiu. Quem era ele para extinguir uma luz tão antiga? Que direito tinha de transformar lenda em carne e osso apenas para satisfazer uma curiosidade ou encher a barriga por poucos dias?

Lentamente, dolorosamente, Bjorn abaixou o arco. A flecha permaneceu na corda, não disparada.

O Cervo Branco inclinou a cabeça magnífica, um gesto que pareceu de compreensão, talvez até de respeito. Então, com a mesma graça silenciosa com que apareceu, ele se virou e caminhou para dentro da névoa espessa. Não correu, simplesmente se dissolveu na paisagem, a luz pálida diminuindo até que apenas a clareira silenciosa permanecesse.

Bjorn ficou ali por um longo tempo, o frio penetrando em seus ossos, mas seu espírito estranhamente aquecido. Ele não voltaria com carne ou pele naquele dia, mas voltaria com algo mais pesado, mais significativo: uma história. A história do caçador que encontrou a lenda e escolheu deixá-la viver, compreendendo que algumas coisas em Valheim eram mais valiosas intocadas, como ecos de um mundo que os deuses talvez quisessem que eles lembrassem, e não apenas conquistassem. Ele guardaria os rastros na memória, um segredo entre ele e a floresta profunda.